14 de junho de 2024

Projeto Tanguro: Simpósio celebra os 20 anos de estação de pesquisa em fazenda da AMAGGI

As mudanças climáticas foram o centro do debate entre produtores rurais, cientistas, poder público e povos indígenas no Simpósio de Celebração dos 20 anos da Estação de Pesquisa Tanguro, que ocorreu em Brasília, de 10 a 12 de junho. O evento, que destacou o diálogo entre os grupos como chave para a transformação socioambiental e econômica em prol de um futuro possível à vida na Terra, teve como uma das participantes a diretora de Comunicação, ESG e Compliance da AMAGGI, Juliana Lopes.

Funcionando como um laboratório a céu aberto, a Estação de Pesquisa Tanguro fica dentro da Fazenda Tanguro, de propriedade da AMAGGI, no município de Querência, em Mato Grosso, no sudeste amazônico. Foi fundada pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com a AMAGGI e o Centro de Pesquisa Climática Woodwell, dos Estados Unidos. Em duas décadas de existência, os resultados dessa iniciativa conjunta somam mais de 180 publicações científicas de alto impacto e reúnem pesquisadores de sete países estudando meio ambiente e agricultura.

Juliana Lopes exaltou a importância da parceria com o IPAM. “Essa foi a forma que a AMAGGI encontrou de, com pesquisadores, fazer uma avaliação de como podemos garantir perenidade na produção agrícola, investindo em conservação da biodiversidade e de áreas nativas”, disse.

Juliana Lopes, diretora de ESG, Comunicação e Compliance da AMAGGI (Foto: IPAM)

André Guimarães, diretor executivo do IPAM, lembrou que o pressuposto do trabalho na Estação de Pesquisa Tanguro é aproximar a produção agrícola da conservação da natureza. “A revolução no campo custou quase 50% do Cerrado e 20% da Amazônia, esse modelo não se sustenta mais”, disse. “É preciso formular perguntas junto às empresas, pois elas também vão ter que adaptar os serviços a uma condição climática nova”, completou.

A pluralidade de experiências e do conhecimento partilhado no simpósio foi destacada por Max Holmes, CEO do Centro de Pesquisa em Clima Woodwell, instituição que atua ao lado do IPAM há 30 anos.

“Reunir este grupo de experts da ciência, da sociedade civil e dos mais diferentes lugares me dá esperança e otimismo. O desafio para todos nós é levar adiante as grandes ideias em torno das soluções climáticas discutidas. As conferências do clima são oportunidades para continuar a progredir nesses temas incrivelmente urgentes, e que só podem ser resolvidos em parceria”, acentuou Holmes.

Equilíbrio

O encontro de diferentes setores em torno da discussão socioambiental e econômica se insere em um momento no qual estudos mostram a perda das funções naturais de florestas tropicais devido à queima de combustíveis fósseis global, e, no Brasil, principalmente por conta de desmatamento, degradação e fogo.

Simpósio em Brasília reuniu pesquisadores brasileiros e estrangeiros (Foto: Divulgação)

Serviços ecossistêmicos, como são chamados os benefícios produzidos pela natureza, mantêm todas as formas de vida garantindo a qualidade do ar e a disponibilidade de água e alimento, por exemplo. Contribuem com a polinização, o controle de pragas e a regulação do clima local, provendo chuva, umidade e temperatura adequadas para a produção agrícola.

“Como nós construímos uma solução de uso de solo para que a pessoas compreendam que é possível conciliar floresta com conservação, desenvolvimento com geração de emprego e renda a partir de um melhor uso daquilo que nós já derrubamos? Esse é o desafio do Brasil. Por isso nós temos buscado a parceria com o IPAM. Por isso criamos, no Estado do Pará, a Política Estadual de Mudanças Climáticas e o programa Amazônia Agora”, disse Helder Barbalho, governador do Estado do Pará, presente no evento.

“Não sabemos como vai ser o mundo daqui para frente, só sabemos que não pode ser igual. Temos muito a aprender e a construir um com o outro. A mudança climática é real e o produtor percebe, mas se ele não se sentir pertencente na conversa sobre o que precisa melhorar, fica difícil engajar”, afirmou Juliana Lopes, diretora de ESG, Comunicação e Compliance da AMAGGI.

De 2022 para 2023, a agropecuária cresceu 15,1%, influenciando o desempenho do PIB, mas ainda pressiona os biomas brasileiros. A Estação de Pesquisa Tanguro desenvolve estudos para entender a influência da floresta na agricultura e vice-versa, de maneira a subsidiar estratégias de produção e conservação ambientalmente e socialmente sustentáveis.

Evento em Brasília teve apresentações de resultados de diversas pesquisas. (Foto: Divulgação)

“Resultados das pesquisas da Tanguro socializados conosco são importantes para ver novas perspectivas e desenvolvermos a agricultura garantindo a segurança alimentar”, acrescentou Ângela Conceição, presidente da FETAGRI (Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do Pará).

Produção de conhecimento

Estocando metade do carbono emitido no globo, as florestas tropicais proporcionam estabilidade climática. Esta capacidade de estoque está sendo prejudicada pelas mudanças climáticas causada por atividades humanas. “Nosso desafio é encontrar maneiras de manter esse serviço e, ao mesmo tempo, o crescimento e a prosperidade”, afirmou Michael Coe, pesquisador do Centro de Pesquisa Climática Woodwell.

E como achar resposta a este desafio? A solução pode estar na própria natureza. Dados apresentados por Wayne Walker, cientista sênior do Woodwell, mostram que as soluções baseadas na natureza têm o potencial de entregar 37% da redução de emissões necessária para limitar o aumento da temperatura média global a menos de 2°C. “A terra é mais do que só uma reserva de carbono. Precisamos implementar essas soluções de uma maneira escalável, garantindo fluxos de capital com equidade e sustentabilidade”, comentou.

O pesquisador Filipe Arruda, do IPAM, destacou que os distúrbios ambientais vêm ocorrendo mais intensamente com as mudanças climáticas. “O impacto no habitat modifica as espécies animais e vegetais no local, alterando desde o controle da temperatura ao controle de pragas dentro da floresta e nas áreas de agricultura”.

Leonardo Maracahipes, coordenador da Estação de Pesquisa Tanguro e pesquisador do IPAM, apresentou estudo sobre a alteração nas folhas de árvores em áreas de floresta intacta e nas fragmentadas pela atividade agrícola. “A espessura da folha foi maior na área de agricultura, enquanto o tamanho da folha foi maior nas áreas de floresta preservada”, explicou, demonstrando estratégias da vegetação para se adaptar ao entorno.

Pesquisadores participaram de mesas de trabalho para discutir soluções ambientais (Foto: Divulgação)

Na lavoura, os efeitos da natureza também são objeto de estudo: “estimamos uma redução de 6% na produtividade de soja a cada 1°C de aumento na temperatura”, citou Ludmila Rattis, pesquisadora do IPAM e do Centro de Pesquisa Climática Woodwell. Do lado positivo, quando a floresta é mantida, ajuda na produção. Bianca Rebelatto, pesquisadora do IPAM, lembrou que 90% da agricultura do Brasil não é irrigada e que florestas protegem plantação contra ondas de calor e reduzem futuros desafios climáticos.

Respostas apresentadas pelos setores para evitar mais eventos extremos, reduzindo os danos ao meio ambiente e promovendo formas de viver responsáveis incluem, além da produção sustentável, a bioeconomia dos produtos naturais da Amazônia e do Cerrado.

“A mudança de uso do solo e a mudança do clima já aumentaram as chances de um incêndio catastrófico no Xingu em mais 10%”, explicou Paulo Brando, pesquisador associado do IPAM e professor na Universidade de Yale, dos Estados Unidos. “Cerca de 16% das florestas no sudeste da Amazônia podem queimar devido a esses fatores. Florestas degradadas pelo fogo parecem saudáveis do ponto de vista do sensoriamento remoto, mas são muito mais vulneráveis a eventos extremos como a seca, e é o que está acontecendo no Xingu e boa parte da região”.

Segundo Brando, a região do Xingu está 2°C mais quente devido ao aumento do desmatamento e à pressão humana sobre a paisagem natural. O Território Indígena do Xingu funciona como um ar-condicionado local, com 5°C a menos que monoculturas e pastagens vizinhas, revelou uma nota técnica produzida pelo IPAM e o Centro de Pesquisa Climática Woodwell.

Enquanto a situação não se resolve, os povos do Xingu seguem com dificuldades para produzir. “Temos a terra, mas continuamos comprando na cidade. Nós, do Xingu, ainda estamos estudando como podemos fazer uma produção em maior escala”, contou Yuri Kuikuro, mestrando em Ecologia no INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). “É preciso levar jovens para capacitar, usar tecnologia, para tentar entender como produzir para mantermos a nossa cultura. Somar ciência para descobrir isso”, concluiu.

Sobrevivência

“Primeiro a gente tem que pensar em sobreviver às mudanças climáticas: trabalhar no coletivo, independentemente de ser sociedade civil, empresa ou poder público, pela nossa sobrevivência física e mental”, indicou Mauro O’ de Almeida, secretário de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, presente no simpósio.

A emergência no clima alerta para o ponto de não retorno da Amazônia, também conhecido de ponto de inflexão, a partir do qual o bioma perderia suas capacidades naturais e passaria a constituir um tipo de ecossistema degradado — uma “Amazônia zumbi”. No Cerrado, a realidade também preocupa cientistas, dado que a maior parte da vegetação nativa remanescente do bioma encontra-se dentro de propriedades rurais privadas.

Estação de pesquisa fica dentro da Fazenda Tanguro, em Querência (Foto: Divulgação)

“É comum ouvir que o mundo vai acabar, mas já acabou, em razão das mudanças climáticas, para as pessoas que morreram no Rio Grande do Sul”, disse a pesquisadora Ludmila Rattis, em referência ao evento climático extremo das chuvas no Rio Grande do Sul neste ano. Cerca de 175 pessoas morreram e 38 estão desaparecidas. Mais de 2 milhões foram atingidas pelas enchentes, segundo a Defesa Civil.

Na Amazônia, a seca do Rio Negro em 2023 atingiu todas as 62 cidades do Estado do Amazonas e afetou mais de 600 mil pessoas, também conforme a Defesa Civil estadual.

“O Território Indígena do Xingu também está sendo impactado pelas mudanças climáticas. Os povos indígenas falam disso há muito tempo e não somos levados a sério. Esses eventos extremos estão afetando todos os setores, portanto, sentar-se à mesa com parceiros que já foram nossos inimigos mostra como precisamos estar unidos para mudar o cenário que temos”, defendeu Kaianaku Kamaiurá, coordenadora de parcerias no NOSSAS e articuladora do projeto Amazônia de Pé.

Os compromissos climáticos do Brasil e do mundo, a serem renovados e ampliados até a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas), em Belém, são a medida necessária para evitar a piora nas condições de habitação no planeta e impedir que mais vidas sejam perdidas.

Fazenda Tanguro tem 48,6 mil hectares de áreas preservadas (Foto: Divulgação)

“Primeiro, que o mundo possa acelerar a mudança da matriz energética para parar de emitir gás carbônico. Em segundo lugar, pagar pela manutenção da floresta e sua recuperação. Antigamente, lembro que o agronegócio se colocava contra o debate climático, mas hoje não: assumiu uma consciência de que precisa da floresta. A COP30 será o grande espaço político da Amazônia para exigir do mundo uma atenção para quem está preservando”, avaliou Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar.

O Simpósio de Celebração dos 20 anos da Estação de Pesquisa Tanguro foi uma realização do IPAM em parceria com o Centro de Pesquisa Climática Woodwell, Escola de Meio Ambiente da Universidade de Yale e Max-Planck-Geselschaft.

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